domingo, 17 de abril de 2016

RESUMOS DAS COMUNICAÇÕES DO I ENCONTRO DE CRÍTICA E TRADUÇÃO DO EXÍLIO



LITERATURA, HISTÓRIA E MEMÓRIA:
O SUJEITO BRASILEIRO NA DITADURA CIVIL MILITAR NO BRASIL

Laleska Daniely Silva de LIMA (G/UFG)
Orientadora: Profa. Dra. Tarsilla Couto de BRITO (D/UFG)

“Eu não sabia nada de mim, como vim ao mundo, de onde eu tinha vindo. A origem, as origens. Meu passado, de alguma forma, palpitando na vida dos meus antepassados, nada disso eu sabia [...] Anos depois, desconfiei: um dos gêmeos era meu pai”. (Milton Hatoum, Dois Irmãos, p.73)

Esta pesquisa, apresentada no I Encontro de Crítica e Tradução do Exílio, teve como objetivo apresentar dados bibliográficos acerca de obras literárias, especificamente romances, de 1964 a 2015, que foram lançadas no Brasil e têm como elemento contextual a ditadura civil-militar no mesmo. Os livros apresentados foram:
Feliz Ano Velho (1982) - Marcelo Rubens Paiva.
Verdes Anos (1984) - Luiz Fernando Emediato.
Bar Don Juan (1971) – Antônio Callado.
Quarup (1967) - Antônio Callado.
Reflexos do Baile (1977) – Antônio Callado.
Sempreviva (1981) – Antônio Callado.
Zero, de Loyola Brandão (lançado em 1974, na Itália, em 1975 no Brasil, mas proibido no ano seguinte até 1979).
Em Câmara Lenta (1977) - Renato Tapajós.
A Festa (1976) - Ivan Ângelo.
Incidente em Antares (1971) - Érico Veríssimo.
O que é isso, companheiro? (1979) - Fernando Gabeira.
Pessach, a travessia (1967) - Carlos Heitor Cony.
Onde andará Dulce Veiga? (1990) - Caio Fernando Abreu.
Dois Irmãos (2000) - Milton Hatoum.
Cinzas do Norte (2006) - Milton Hatoum.
Os bêbados e os sonâmbulos (1996) - Bernardo Carvalho.
K. (2011) - Bernardo Kucinski.
Apartamento 34 (2012) - Sergio Haddad.
Essa lista se trata de um levantamento bibliográfico que mostrasse todas as obras produzidas no Brasil acerca do cenário de ditadura, para justificar a escolha de um romance que falasse sobre esse momento histórico de forma a ilustrar e nos fazer pensar o que era ser brasileiro naquele contexto, e não um que fosse panfletário, apenas documental, que expusesse. Assim, o olhar da escolha do romance refere-se à memória, qual o lugar do cidadão brasileiro diante do que estava acontecendo, o que era refletido no seu cotidiano e em quais proporções aparecia, se era em primeiro, segundo ou terceiro plano.
Para que a escolha do livro respondesse a essas questões, esse estudo foi fundamentado, também, nas concepções de história e memória do historiador Jacques Le Goff, membro da Escola dos Annales.  O qual diz-nos que a história exprime três conceitos diferentes:
·              "Esta procura das ações realizadas pelos homens" (Heródoto) que se esforça por se constituir em ciência, a ciência histórica.
·              "O objeto de procura é o que os homens realizaram. Como diz Paul Veyne, "a história é quer uma série de acontecimentos, quer a narração desta série de acontecimentos".
·              "A história como narração. Uma história é uma narração, verdadeira ou falsa, com base na "realidade histórica" ou puramente imaginária – pode ser uma narração histórica ou uma fábula."
Além disso, Jacques Le Goff diz-nos que memória é a propriedade de manter algumas informações, propriedade essa referente a um conjunto de funções psíquicas que, por intermédio delas, o indivíduo atualiza impressões e informações do passado, ou reinterpreta como passadas. Portanto, a memória social aborda, fundamentalmente, os problemas do tempo e da história. Partindo dessas conceituações, o historiador difere memória e história, sendo a história o que representa fatos distantes, e a memória o que age no que já foi vivido. Mas, mesmo sendo diferentes são essenciais, pois a história resgata o passado do ponto de vista social, e a memória reflete a coletividade, algo que foi apreendido de lembranças ou repassado,  mas que pertencem a um grupo, por isso memória coletiva.
Outra distinção de história e memória é que a história trabalha com um acontecimento da e para a sociedade, diferente de memória que equipara-se no que reflete no indivíduo, quais situações sociais e históricas foram marcantes, formam-no. Sustentado nisso, o procurar uma obra literária brasileira que fosse romance, precisa abranger e perceber esses pontos conceituais importantíssimos para o reconhecimento de um "eu histórico", marcado ou não pela ditadura civil militar no Brasil, pois esse período teve a sua importância, mas qual foi, pontualmente, percebido na literatura? Essa é uma das questões que norteiam esta pesquisa e que levou na escolha da obra Dois Irmãos, de Milton Hatoum, publicada em 2000.
O romance narra a vida de uma família libanesa em Manaus, onde os conflitos entre os irmãos gemêos Yaqub e Omar são narrados por Nael, filho de Domingas, empregada da casa. O foco narrativo são os dois irmãos, mas o que faz a narrativa ser altamente memorial é o fato de Nael querer descobrir o seu papel naquele lugar, qual dos gêmeos seria seu pai. E ele faz isso através de flashbacks, narrando seu passado para reconstruir a história da família libanesa que possivelmente era a sua.
Dessa forma, Nael, durante a narrativa, questiona e enumera diversos acontecimentos na procura de se reconhecer naquele ambiente, que também foi marcado pela implantação da ditadura no estado de Manaus, o projeto de modernização, a prostituição, as desigualdades sociais, sendo não só um romance que narra as desavenças de dois irmãos, mas o que marca a vivência deles e a maneira como o narrador construiu essa perspectiva de mudança no convívio da família e no convívio social.
Portanto, foram e são esses os pontos que norteiam essa pesquisa, que não desassocia o homem do seu momento histórico, mas que além de aproximá-lo faz com que reflita e procure o seu lugar em episódios de tensão, tanto familiar como factuais, memoriais.  

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